We Pick analisa – Arte, Moda e a campanha da Tiffany com Basquiat

Reprodução/Instagram @beyonce

25/08/2021 - por Malu Pinheiro

Nesta segunda-feira, 23, Beyoncé e Jay-Z tornaram-se um dos assuntos mais comentados ao estrelar a nova campanha da joalheria Tiffany & Co. Nomeada de “About Love”, a cantora aparece usando o famoso Diamante Tiffany – uma pedra amarela de 128 quilates de valor estimado de US$ 30 milhões. Até hoje, apenas outras quatro pessoas utilizaram a peça: Mary Whitehouse em 1957, Audrey Hepburn no filme “Bonequinha de Luxo”, Lady Gaga na cerimônia do Oscar em 2019 e a atriz Gal Gadot no filme “Morte no Nilo”.

A campanha é dirigida por Emmanuel Adjei, também responsável pelo trabalho “Black Is King” de Beyoncé, e deve estrear no próximo mês.

Apesar de todo o glamour e referências que carregam a divulgação, um outro detalhe chamou a atenção: um quadro inédito de Jean-Michel Basquiat. A tela, Equals Pi (1982), assinada pelo artista, tem o clássico tom de azul da Tiffany & Co – que adquiriu recentemente a obra de arte para a campanha (a obra estava nas mãos de um colecionador particular desde o início dos anos 1980).

Mas, afinal, quem foi Basquiat?

Jean-Michel Basquiat (Foto: Reprodução/Instagram @basquiat_archive)

Jean-Michel Basquiat foi um artista neo-expressionista. Nascido em Nova Iorque, em 22 de dezembro de 1960, ele ganhou popularidade como grafiteiro até tornar-se o primeiro afro-americano a fazer sucesso nas artes plásticas da cidade. Descoberto pelo artista Andy Warhol, os dois ficaram próximos e trabalharam em um esquema de co-criação – no qual cada um deixava suas características nas obras.

Filho de um haitiano com uma nova-iorquina, Basquiat falava espanhol, francês e espanhol desde criança. Com uma trajetória que inclui tanto fugas de casa tanto uma expulsão pelo pai, ele chegou a morar nas ruas de Nova Iorque – justamente por isso sua arte começou a se desdobrar nas ruas e metrôs entre 1970 e 1980.

Basquiat nunca frequentou nenhuma escola de arte – inclusive foi reprovado nos cursos que fez. O artista, então, teve sua formação nas ruas de Nova Iorque e nos museus da cidade. Em parceria com seu amigo Al Diaz, eles criaram o pseudônimo “SAMO” (“Same Old Shit”) e grafitaram muros e prédios da região com a assinatura – assim como Banksy faz atualmente.

Com 21 anos, ele já estava expondo na Califórnia e Alemanha. Entre os anos 1981 e 1982, ele chegou a produzir 250 pinturas e 500 desenhos.

Para lidar com a pressão do grande sucesso – e também com a sua conturbada amizade com Andy – ele acabou caindo nas drogas. Em 1988, aos 27 anos, ele faleceu por overdose acidental de heróina. Após sua morte, suas obras chegaram a ser leiloadas por mais de 110 milhões de dólares (ultrapassando o próprio Warhol).

Equals Pi (Foto: Reprodução/Instagram @basquiat_archive)

A obra Equals Pi será exibida na boutique principal da Tiffany na Quinta Avenida, que atualmente está passando por reformas.

A Moda e a Arte

Sobre a relação da moda com a arte, para Danielle Nastari, doutoranda e mestre em história da arte pela USP e professora de história da moda no Instituto Europeu di Design, a Tiffany & Co utilizar Basquiat em sua campanha inspira uma inovação na imagem da marca. “Se formos analisar a campanha com Jay-Z e Beyoncé, percebemos que enquanto o rapper faz referência ao Basquiat, Beyoncé faz ao filme Bonequinha de Luxo – uma mistura de transgressão com tradição”, diz.

Para Danielle, o artista foi um transgressor – e ela explica: “Ele tinha uma relação muito forte com a arte de rua, pintava os grafites em telas. Nova Iorque vivia um período, desde a década de 70, em que estava tomada por gangues,  e essa cultura conquistava o mainstream. Vemos isso também com o hip-hop na música por exemplo. Basquiat, então, é alguém jovem, negro e que consegue alcançar a fama trazendo uma linguagem de uma cultura específica. Isso faz um contraste com a imagem clássica representada por Beyoncé, que por sua vez faz referência a Audrey Hepburn”, afirma.

Não é de hoje que a moda se alimenta de referências artísticas. “Essa relação de moda e arte acontece desde o começo do sistema da moda pós Revolução Industrial, em meados da década de 40. Jaques Doucet, designer de moda francês, vai utilizar por exemplo estampas impressionistas para criar vestidos. Um outro exemplo icônico é o vestido Mondrian que Yves Saint Laurent fez na década de 60 referenciando o clássico pintor holandês Piet Mondrian – cuja obra fez sucesso na década de 20”, lembra.

Vestido Mondrian, de YSL, inspirada na obra de Piet Mondrian (Reprodução/Pinterest @FTCMAG)

A especialista em história da moda também afirma que grandes criadores possuem profissionais com um vasto repertório de conhecimento da cultura e das artes. “Eles conhecem, não só visualmente, mas também qual o contexto daquela criação ter surgido. Então, quando a gente conhece e estuda essas referências, a gente entende não só as obras, mas também porque foram criadas. No caso da Beyoncé e Jay-Z, a gente vê uma mistura de uma referência clássica com uma disruptiva”, explica.

Mas, é fácil utilizar referência de arte em criações de moda? Danielle afirma que é necessário muito estudo! “Ainda é comum no Brasil marcas e influenciadores dizerem que estão referenciando o trabalho de alguém, quando na verdade é apenas uma reprodução estética. É necessário um questionamento, uma proposição de certas conexões entre a referência e o trabalho final contemporâneo que está sendo realizado”, finaliza.

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